sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

INADIMPLÊNCIA DOS CARCINICULTORES NO BNB CHEGA A 70%



Setenta por cento dos financiamentos concedidos nos últimos três anos pelo Banco do Nordeste (BNB) a criadores de camarão nos estados onde o banco atua estão atrasados. A taxa de inadimplência do setor é quase 15 vezes maior que a taxa média de inadimplência do banco (4,8%). Ao todo, a  instituição emprestou R$ 710 milhões a 513 criadores. Do total de criadores, 60% não pagaram em dia as prestações.

O BNB não divulgou os dados do Rio Grande do Norte, mas afirma que a situação do estado não é muito diferente. Embora não revele as taxas dos outros segmentos, o banco afirma que nenhum a atividade é tão inadimplente quanto a carcinicultura.

Os dados foram apresentados ontem pelo superintendente do banco no Rio Grande do Norte, João Nilton Castro Martins. A inadimplência em alta levou a instituição a suspender, desde 21 de janeiro, novas operações de custeio e financiamento para os carcinicultores.

Em entrevista à TRIBUNA DO NORTE, o superintendente afirmou que alguns criadores já procuraram o banco para renegociar as dívidas e explicou que o BNB está realizando um estudo para identificar as razões e possíveis soluções para tamanha inadimplência. "Fechando esse estudo sobre o setor há a expectativa de retomar a regularidade", disse ele. O banco também pretende se reunir com os carcinicultores. Mas nem a conclusão do estudo nem a reunião tem data definida. Segundo o superintendente, entretanto, projetos que demonstrem viabilidade têm chance de ser aprovados.

OUTRO LADO

A Associação Brasileira de Criadores de Camarão (ABCC) contesta os dados e promete um relatório independente até o final do mês. O levantamento, como explica Itamar Rocha, presidente da Associação, trará quanto foi emprestado pelo banco para todos os segmentos nos últimos anos e a taxa de inadimplência de cada setor. A ABCC também está ouvindo os criadores que fizeram empréstimos para saber quem está ou não inadimplente. "Já ouvimos vários. Quem ainda não pagou, renegociou a dívida. Se o RN tiver dois ou três criadores que não estão pagando é muito". Segundo Itamar, "o estado não tem nem 20 produtores com empréstimos, seja no BNB ou em qualquer outro banco".

Além da taxa de inadimplência, Itamar Rocha contesta o valor liberado pelo banco para o setor nos últimos três anos. "O banco não emprestou R$ 710 milhões. Isso não é verdade. De onde o banco teria liberado R$ 710 milhões? (sic)". Quem contraiu empréstimo, afirma Itamar, contraiu principalmente em 2004, quando o setor viveu o auge. "De 2009 para cá, não saiu mais nada. Só renegociação. Nem colocando de cabeça para baixo daria este número", afirmou.

"Suspensão é comum em casos como esse"

O economista Janduir Nóbrega,  coordenador do curso de Gestão Financeira da Universidade Potiguar (UNP), prefere não comentar o dado apresentado, mas explica que é comum bancos suspenderem novas operações para setores com alta taxa de inadimplência. "Esta é a primeira coisa que o banco faz quando deixa de receber. É algo comum".

Segundo Janduir, em casos como esse os financiamentos só são liberadores depois que o setor prova que pode pagar. "É pouco provável que o banco volte a colocar dinheiro na carcinicultura antes disso. O banco não quer jogar dinheiro fora".

Para o economista, a questão é muito mais séria do parece. A suspensão do crédito, na avaliação dele, pode impactar na geração de emprego e renda, além de reduzir a produtividade. De 2004 para 2011, a produtividade brasileira caiu quase pela metade e as exportações acabaram.

O cenário, apesar das dificuldades, parecia promissor, segundo os carcinicultores. O Brasil, que até 2004 consumia apenas 25% de todo camarão produzido no Brasil, passou a consumir 99,8% em 2011. "A crescente demanda exige um aumento da produção interna, cuja saída é a intensificação da produção, que mesmo sem expansão da base física requer financiamentos bancários", argumenta Itamar Rocha.

ABCC envia carta de protesto contra restrições a criadores

Na tentativa de obter respostas para a suspensão dos financiamentos, a Associação Brasileira de Criadores de Camarão (ABCC) enviou uma carta para o presidente do Banco do Nordeste (BNB), Ary Joel de Abreu Lanzarin, na última semana. Uma cópia foi encaminhada para o ministro da Pesca e Aquicultura, Marcelo Crivella, o da Integração Nacional, Fernando Bezerra, o da Previdência Social, Garibaldi Alves Filho, o das Cidades, Agnaldo Ribeiro, e para os governadores, senadores e deputados federais dos estados produtores de camarão.

Na carta, a associação cobra explicações, estranha a 'falta de diálogo', e pede a 'imediata reconsideração/revogação' da suspensão das operações de crédito. O texto é assinado por Itamar Rocha, presidente da ABCC, e diz num dos trechos que "medidas drásticas que afetam um setor produtivo do Nordeste não podem nem devem ser tomadas no âmbito fechado da Diretoria do banco sem antes manter um diálogo prévio ou entendimento com as lideranças políticas, com o próprio setor e as comunidades afetadas".

O superintendente do BNB no RN atestou o recebimento, mas explicou que ela deverá ser respondida pelo presidente do banco, a quem foi endereçada. Quanto a falta de diálogo, Nilton explica que a decisão de suspender o crédito foi tomada internamente diante dos números e que por isso o setor não foi consultado. Uma reunião, segundo ele, será agendada com os criadores de camarão.

Segundo o novo recenseamento da ABCC, há 1.544 criadores de camarão em todo o país - quase 1/3 deles só no Rio Grande do Norte. Juntos, eles empregam cerca de 70 mil pessoas direta ou indiretamente.

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