Guilherme Reis (O Tempo)
Um possível surto de “contas-sujas” nos próximos quatro anos, mais uma vez joga o holofote sobre o cenário de quebradeira das cidades brasileiras. A Confederação Nacional dos Municípios (CNM) estima que, até 2016, aproximadamente 3 mil prefeitos podem se tornar inelegíveis ao deixarem os cargos com dívidas.
E uma parte desses gestores na “corda bamba” já terá sido vítima dos anteriores, de quem herdaram débitos. Se a previsão da entidade chegar perto de se cumprir, a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) seria jogada no lixo: ou as finanças municipais são inadministráveis ou os prefeitos são desonestos, incompetentes e se fiam na impunidade.
A aposta natural seria na segunda opção. Contudo, o volume de prefeituras quebradas e de prefeitos envolvidos nessa projeção deriva a discussão para outro ponto: a revisão da norma fiscal.
SÓ MÁ GESTÃO?
O especialista em direito administrativo e advogado João Henrique Café avalia que “é fato” que, depois de sua criação, a administração pública melhorou. Contudo, estaria na hora de mudar. “Eu defendo uma flexibilização da lei, porém, ela tem que ser feita com outra lei. Não pode ser feita em cima de um acordo com os Tribunais de Contas”, defende.
A situação seria bem mais complexa do que uma revisão legal. Jaime Nápoles Villela, outro jurista, reconhece que existe má gestão. Contudo, aponta que, antes de mexer nas regras, seria preciso repensar a estrutura da federação.
“Não podemos considerar que 3 mil prefeitos sejam ficha-sujas. Existe um motivo maior. A concentração de receita da União faz com que o lado mais fraco sofra mais. Eu fui procurador em Barbacena e sei que os prefeitos temem a Lei de Responsabilidade Fiscal”, aponta o advogado.
FEDERAÇÃO
O presidente da CNM, Paulo Ziulkoski, também critica o atual modelo de pacto federativo e destaca o aspecto nocivo para as prefeituras das isenções fiscais praticadas pela União. Segundo o dirigente, o Brasil é o “país do faz de conta”.
“As desonerações só acontecem em impostos cuja receita é repassada para os municípios. Como que se administra uma cidade com queda de sua principal fonte de renda?”, critica Ziulkoski, referindo-se à redução de repasses do Fundo da Participação dos Municípios (FPM) causado pela desoneração do IPI.
Já o presidente da Associação Mineira de Municípios (AMM), Ângelo Roncalli, acredita que a LRF deveria ser mais flexível e considerar os casos de queda de repasses. “Ela não especifica em nenhum item uma mudança da apreciação das contas das cidades que tiveram problemas com os repasses do governo federal”.