domingo, 22 de fevereiro de 2015

MERGULHO NO UNIVERSO CASCUDO


Entre relíquias e até figurinha de desenho animado vários objetos estão vindo à tona
no Ludovicus – Instituto Câmara Cascudo, na antiga casa do historiador

Por: Yuno Silva

O escritor, pesquisador, historiador, etnógrafo, professor, jornalista e advogado Luís da Câmara Cascudo (1898-1986), que não gostava de ser chamado de folclorista apesar de ser referência na área, tinha mania de guardar tudo que lhe interessava. Seu espólio ainda não foi totalmente revelado, e a cada novo ‘mergulho’ no universo cascudiano surgem pérolas dignas de compor uma exposição de alcance internacional tamanha a diversidade de assuntos que o maior dos intelectuais do Rio Grande do Norte dominava. Livros antigos, relíquias históricas e curiosidades que atestam o alcance de suas amizades.

Entre as raridades que estão sendo descobertas, destaque para um missal romano escrito em latim que pertenceu ao Padre Cícero (a relíquia contém anotações do próprio datada de 1908), presente de aniversário oferecido pelo Padre Chacon a Cascudo em 1968; um livro impresso em páginas de cetim, numerado e personalizado, com ilustrações feitas à mão, editado no Rio de Janeiro em 1944 pela Confraria Bibliófila Brasileira Cattleya Alba; o relógio de ouro de algibeira que Cascudo usava.

Também constam fotos da viagem que Cascudo fez à África em 1963; a curiosa Carteira do Bom Marido (em branco); negativos de vidro com imagens antigas da Ribeira e microfilmagem de ilustrações que Frans Post fez no século 17 no período da dominação holandesa (1630-45); documentos pessoais como uma identidade ainda dos tempos de solteiro e boletins escolares; recortes de jornais de todo o mundo falando sobre suas pesquisas; e caricaturas que recebia de presente de chargistas de todo o país.

“Cascudo guardava tudo, desde envelopes com selos de várias partes do mundo até um pedaço de embalagem daqueles produtos de beleza da Elke Maravilha. Também encontramos a miniatura de uma camisa do Botafogo do Rio de Janeiro alusiva ao bicampeonato do clube e muitos caderninhos com anotações”, disse o restaurador Woldney Ribeiro, que trabalha na organização do acervo há cinco anos, desde a abertura, em janeiro de 2010, do memorial e museu Ludovicus – Instituto Câmara Cascudo, criado pela família como forma de preservar a memória do potiguar ilustre. “Outro dia encontrei uma figurinha da Pantera Cor de Rosa, acredito que ele era fã da personagem”, arrisca Ribeiro.

“Não desprezamos nada, tudo tem seu lugar”, adiantou Daliana Cascudo, neta do historiador e diretora responsável pelo Instituto, que é aberto à visitação pública (de terça a sábado) e funciona na casa que pertenceu à família de sua mulher Dahlia, onde o historiador morou com ela e os filhos, ali na subida da Ribeira para a Cidade Alta. Segundo Daliana, a proposta é digitalizar tudo e disponibilizar para consulta de maneira informatizada em terminais instalados na própria sede do Instituto. 

“As peças mais valiosas ficam guardadas em outro lugar por questão de segurança, caso do relógio de ouro que tem uma foto da minha avó (Dona Dahlia) colada por dentro do vidro para vovô lembrar dela todas as horas do dia”, frisou Daliana. “Com a digitalização, todos poderão ter acesso a esse material”.

Daliana e o restaurador receberam a reportagem do VIVER em uma tarde movimentada: o professor Humberto Hermenegildo (da UFRN), estudioso da obra de Cascudo, e o pesquisador e jornalista Sandro Fortunato também visitavam o Instituto e ficaram surpresos com a quantidade de material inédito ali reunido. “Dá para desdobrar esse acervo em várias exposições temáticas”, sugeriu Hermenegildo.

Cartas
A digitalização dessa parte do acervo deixado por Câmara Cascudo, que também inclui livros, obras de arte e cartas, é a segunda etapa de um trabalho que começou em 2010 quando o Ludovicus foi inaugurado. “É tanta informação, tanta curiosidade, que bebemos da história sem querer”, anima-se o restaurador Woldney Ribeiro.

A primeira etapa consistiu na identificação, catalogação e digitalização das quase trinta mil cartas que Cascudo trocou ao longo da vida com personalidades do quilate de Mário de Andrade, Monteiro Lobato, Assis Chateaubriand, Getúlio Vargas, Juscelino Kubitschek, entre outras figuras do Brasil e exterior. Como Cascudo colecionava e arquivava de acordo com critérios pessoais, muita coisa está misturada e não será nenhuma surpresa se a cada investida no acervo surjam novidades.

“Quando começamos a mexer nas cartas encontramos muitas fotos, recortes jornais, entre outros documentos”, lembrou Daliana. “O que eu pude separar ia organizando, mas agora chegamos à parte mais trabalhosa desse material; tem bastante coisa misturada ainda como cartazes e folhetos, souvenires, medalhas”, acrescentou Ribeiro. Vale lembrar que as cartas estão disponíveis para consulta em terminais instalados no próprio Instituto. “Por questões de direitos autorais não podemos disponibilizar essa pesquisa na internet (cascudo.org.br), Cascudo recebeu as cartas mas o autor é outra pessoa”, avisou Ribeiro.

O Ludovicus – Instituto Câmara Cascudo funciona no número 377 da Av. Câmara Cascudo (antiga Av. Junqueira Ayres), de terça à sábado, das 9h às 17h. Informações: 3222-3293. Entrada: R$ 3,00 e R$ 1,50 (meia entrada).


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