Os investimentos dos municípios brasileiros em alunos matriculados em creches mostram uma enorme desigualdade entre as regiões do país. Enquanto as cidades do Sudeste gastam, em média, R$ 8.272,43 por aluno anualmente, no Nordeste esse valor cai para R$ 1.876,89. O valor médio anual desembolsado por aluno em uma creche no Nordeste representa apenas 36,5% da média nacional, que foi de R$ 5.144,09.
Esses dados fazem parte da pesquisa “Perfil dos gastos educacionais nos municípios”. Divulgado ontem, em São Paulo, pela União Nacional dos Dirigentes Municipais Brasileiros (Undime), o levantamento traz números de 2009, enviados por 224 municípios.
- Hoje, o futuro de uma criança depende de sorte ou azar. Se tiver sorte, a criança nasce em um município que tem boa arrecadação e pode dar uma educação infantil de qualidade. Se tiver azar, nasce em um município que arrecada pouco e, em muitos casos, não tem condições sequer de manter a educação infantil – afirmou a presidente da Undime, Cleuza Repulho.
A pesquisa aponta ainda que o valor gasto pelas creches nordestinas está muito longe do recomendado pelo Custo Aluno-Qualidade Inicial (CAQi), cálculo feito pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação, e que engloba desde insumos até salários de quem trabalha nas escolas. O CAQi diz que cada aluno deveria custar R$ 6.450,70.
- O cálculo é o custo por aluno para ter um mínimo de qualidade, mas a pesquisa mostra que vamos muito mal porque não conseguimos nem atingir a meta do CAQi. Estamos mais distantes da equidade do que imaginávamos – disse Daniel Cara, coordenador da Campanha Nacional pelo Direito à Educação.
Meses depois de matricular o filho Pedro Cassiano na creche São João, na zona norte de Recife, Daniela Barbosa de Souza decidiu tirá-lo, pois constatou que ele “só vivia doente”. Ela descobriu que, em dias de chuva, a creche é inundada pela água do esgoto que corre a céu aberto em frente à unidade de ensino e, nos banheiros, há retorno de dejetos quando alguém dá descarga.
- Os funcionários são dedicados. O problema é o esgoto – reclamou Marlene Maria da Silva, ex-merendeira da creche e avó e Kiara, que estuda no local.
Vizinha de Daniela, Carla da Silva tem três filhos. O mais novo ficou na São João por um tempo, mas também saiu por causa dos problemas de saúde frequentes.
- Teve problemas na pele e muita diarreia.
A Secretaria de Educação da Prefeitura informou que a creche São João vem passando por serviços de requalificação hidrossanitária e que, até a próxima semana, estará com pintura e colocação de forro concluídos. Informou, ainda, que até 2009, o custo de cada aluno matriculado nas creches era de R$ 1,4 mil. Em 2012, o investimento previsto é de R$ 3 mil, já que foram distribuídos kits, adquiridos 84 mil brinquedos e jogos pedagógicos, e a Prefeitura está construindo novos centros municipais de educação infantil, destinados a crianças de zero a cinco anos.
Embora com diferenças menores, a desigualdade regional é notória ainda quando se trata da educação infantil (creche mais pré-escola): a média nacional de investimentos é de R$ 3.122,36. No Nordeste fica em R$ 1.605,48, enquanto no Sudeste chega a R$ 4.971,26.
- Temos dois Brasis e a disparidade entre o custo com um aluno matriculado no Nordeste e outro no Sudeste não é a única desigualdade. Algumas regiões têm dificuldade também de recursos humanos e técnicos, o que impacta na qualidade da educação – observou Mozart Neves Ramos, do Conselho Nacional de Educação.
No ensino fundamental, cuja média nacional de gastos por ano ficou em R$ 2.937,65 por aluno, a média do Nordeste – a menor do país – ficou em R$ 2.034,89, enquanto a do Sudeste foi de R$ 3.897,77. As séries iniciais (do 1 ao 5 ano) deveriam gastar por aluno, segundo o Ministério da Educação (MEC), R$ 2.096. No entanto, a Região Nordeste gasta R$ 1.948,80. As outras quatro regiões gastam acima do estipulado.
- Essa diferença se reflete nas muitas crianças que concluem os três primeiros anos do fundamental e não estão alfabetizadas plenamente – destacou Mozart.
A diferença entre regiões é visível também na Educação de Jovens e Adultos (EJA). Superintendente-adjunta da AlfaSol, Juliana Opirari reconhece o problema, mas diz que, além de resolver essa questão, o país precisa ampliar a oferta de vagas:
- Os recursos do Fundeb muitas vezes nem chegam. O Brasil tem 65 milhões que não terminaram o fundamental, e a EJA oferece três milhões de vagas.
Presidente do Todos pela Educação, Priscila Cruz alerta:
- Para melhorar, precisa de mais recursos, uma melhor gestão, monitoramento e apoio técnico aos municípios. Falar só em mais verba é ingenuidade.
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