Para especialistas, mudança de critério que prioriza municípios mais pobres na seleção do Minha casa, Minha Vida é decisão coerente, mas o programa habitacional sozinho não resolve o problema da miséria no país
O governo federal decidiu mudar os critérios de escolha dos projetos do programa Minha Casa, Minha Vida para cidades com até 50.000 habitantes, passando a priorizar os municípios onde os índices de pobreza são maiores. Como justificativa para a mudança, o Ministério das Cidades afirmou que considera a habitação “importante para melhorar a vida das pessoas e combater a miséria”.
Para os especialistas, o governo é coerente na mudança, pois nas cidades de pequeno e médio porte a pobreza é um problema maior que o déficit habitacional – critério que era utilizado anteriormente. “Como solução para a miséria, entretanto, o Minha Casa, Minha Vida tem efeito temporário”, afirma o economista Mansueto Almeida. O problema está, segundo o economista, em construir casas em locais onde falta estrutura em outras áreas, como saneamento, saúde e emprego. “Não adianta dar casa para uma família onde, por exemplo, não há oportunidade de trabalho”, explica. “Eles vão acabar vendendo a casa e migrando para outros lugares”.
O Minha Casa, Minha Vida só funcionará efetivamente no combate à miséria caso seja feito um planejamento para integrá-lo a outros programas, afirma Geraldo Tadeu Moreira Monteiro, diretor do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro. “Contudo, hoje não há um alinhamento dos programas de governo”, diz Monteiro. “No nosso último levantamento, eram mais de 300 programas, distribuídos entre os ministérios com diferentes focos e geridos de acordo com a lógica burocrática e ministerial que faz com as ações não conversem entre si”.
Atraso- A mudança no critério de seleção do Minha Casa, Minha Vida para cidades de até 50.000 habitantes atrasou em quase três meses a divulgação do resultado da oferta pública que possibilitará a construção de mais de 107.000 unidades habitacionais em todo o país. O prazo foi adiado três vezes e, por fim, anunciado em 12 de abril. Entretanto, as cotas de unidades habitacionais tiveram que ser redistribuídas por causa do novo critério, processo que deve atrasar o início das obras nos municípios – o que deixou alguns secretários de habitação e prefeitos insatisfeitos.
“O melhor que o governo poderia ter feito era conduzir essa última oferta pública da forma já estabelecida e realizar outra especificamente para atender à questão da miséria”, acredita o presidente do Fórum Nacional de Secretários de Habitação, Carlos Marun. “Inclusive, poderia ser feita uma seleção com um subsídio maior para as famílias beneficiadas, a fim de minimizar a necessidade de contrapartidas, pois vamos tratar com alguns municípios que já são miseráveis e que não têm como colocar mais dinheiro no projeto”, acrescentou.
Com o novo critério, a Região Nordeste passará de 43.000 para 60.000 unidades habitacionais, concentrando mais da metade das moradias que serão construídas nesta fase do programa. Já o Sudeste passará de 29.000 para 12.000 unidades habitacionais. Cada família beneficiada pelo programa receberá um subsídio do governo de 25.000 reais para erguer sua casa.
Por meio de nota, o Ministério das Cidades disse que não houve mudança no critério na seleção dos projetos do Minha Casa, Minha Vida, e sim “uma priorização dos municípios com maior índice de domicílios em situação de extrema pobreza”. No caso das cidades com mais de 50.000 habitantes, a seleção continuará sendo feita pelo déficit habitacional.
O ministério afirmou que o governo assumiu como prioridade o combate à miséria e, para alcançar essa meta, “vários programas têm sido utilizados”. “Ter habitação é um dos compromissos que se incorporou a essa estratégia”, conclui a nota.
Gasto recorde - No ano das eleições municipais, o governo teve um gasto recorde com seu programa-vitrine nos primeiros três meses. Foram 5 bilhões de reais gastos com o Minha Casa, Minha Vida, segundo um levantamento feito com dados do Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal (Siafi) pela ONG Contas Abertas.
O montante é cinco vezes maior que o gasto no mesmo período de 2011 – ano em que a execução orçamentária do programa foi quase nula – e aproximadamente metade de tudo o que foi desembolsado nos últimos três anos com o Minha Casa, Minha Vida: cerca de 10,6 bilhões de reais.
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