Júlio Pinheiro
repórter
Uma vida inteira de dedicação e ainda com as "mãos vazias". O que poderia ser o resumo do insucesso é, na verdade, o exemplo de comprometimento do mestre Juarez Alves com o karate, o caminho das mãos vazias, em tradução literal de Karate-Do. Aos 64 anos, dos quais 45 dedicados à arte marcial, o faixa-preta foi o precursor da modalidade no Rio Grande do Norte, no início da década de 70, e coleciona títulos nacionais e internacionais. Porém, Juarez Alves não hesita em citar o que de melhor o karate trouxe à sua vida: a própria formação como homem. Para ele, a busca pela melhoria na parte competitiva afasta a essência da arte marcial, que é a formação do caráter dos praticantes.
repórter
Uma vida inteira de dedicação e ainda com as "mãos vazias". O que poderia ser o resumo do insucesso é, na verdade, o exemplo de comprometimento do mestre Juarez Alves com o karate, o caminho das mãos vazias, em tradução literal de Karate-Do. Aos 64 anos, dos quais 45 dedicados à arte marcial, o faixa-preta foi o precursor da modalidade no Rio Grande do Norte, no início da década de 70, e coleciona títulos nacionais e internacionais. Porém, Juarez Alves não hesita em citar o que de melhor o karate trouxe à sua vida: a própria formação como homem. Para ele, a busca pela melhoria na parte competitiva afasta a essência da arte marcial, que é a formação do caráter dos praticantes.
Jovem e disposto a canalizar energia em um esporte, Juarez Alves queria uma arte marcial para que pudesse garantir a própria defesa. Buscou o boxe, capoeira, jiu-jitsu, todas sem sucesso, até que encontrou o karate, aos 18 anos, enquanto servia ao Exército
Jovem e disposto a canalizar energia em um esporte, Juarez Alves queria uma arte marcial para que pudesse garantir a própria defesa. Buscou o boxe, capoeira, jiu-jitsu, todas sem sucesso, até que encontrou o karate, aos 18 anos, enquanto servia ao Exército no Rio de Janeiro. Os treinamentos eram no próprio quartel, onde a arte marcial era praticada com a finalidade de preparar os soldados para todas as adversidades em combate. Porém, o que Juarez Alves buscava era o aperfeiçoamento no esporte e, por consequência, ingressar nas competições. "Com 20 anos, disputei minha primeira luta em competição", relembra o mestre, que hoje tem uma visão diferente sobre a importância das disputas esportivas.
Quando retornou para Natal, no fim de 1969, poucas pessoas tinham conhecimento sobre karate. Segundo Alves, as noções eram básicas e frutos de lições retiradas de livros sobre o assunto. O nível no Nordeste, segundo ele, durante muito anos foi muito inferior aos do sudeste do país. "O karate que foi trazido para o Brasil foi muito bruto, faltava um conhecimento mais teórico. Para piorar, os melhores mestres que estavam no país não queriam ensinar no Nordeste", explica Alves. Com isso, o mestre afirma que houve um foco excessivo em competições e os caratecas e novos mestres não se aprofundaram na arte. O problema, na opinião de Alves, prejudicou o nível dos atletas brasileiros. "Na década de 80, o karate do Brasil estava entre os melhores do mundo. Mas os europeus investiram, se aperfeiçoaram, e no Brasil não houve o mesmo nível de crescimento". Segundo o mestre, a própria legislação brasileira prejudicou o karate.
De acordo com o mestre, a facilidade para criação de novas federações, a partir da Lei Zico, contribuiu para uma desvirtuação sobre a essência do karate e criação de grupos que não tinham condições nem conhecimento suficiente para formar novos atletas. Foi a partir daí, há quase 25 anos, que o mestre Alves deixou todas as federações e dedicou-se exclusivamente ao estudo profundo do karate. "Não faço um exame de faixa há anos, não me preocupo em chegar ao 9º dan (atualmente, é faixa preta de 4º dan). O que faço é estudar o karate, a essência da arte, descobrir a gama de golpes que não estão no karate esportivo. É isso que busco passar para os meus alunos", explicou o faixa preta.
Com a busca por parte da população por uma arte marcial mais voltada para as competições, mestre Juarez avalia como "deprimente e sofrível" o nível apresentado no karate nacional nos dias atuais. Para ele, os mestres precisam se reciclar, sob pena de perder alunos e o karate ficar gravemente comprometido no futuro. "O que passo aos meus alunos, que têm em média 30, 40 anos, é a essência do karate tradicional, É o que faço, o que acredito. E vou continuar fazendo", garantiu.
Aos 64, a bagagem de experiência em competições nacionais e internacionais trouxe para Natal títulos brasileiros, sul-americano, Pan-americano e até um brasileiro sênior sem sequer lutar ("Eram oito. Um desistiu, o que eu pegaria em seguida se machucou e os dois que disputaram a outra semifinal foram desclassificados"). "Melhor do que vencer dez lutas, é não precisar lutar", resume um dos principais caratecas do Brasil, que, com a bagagem acumulada, tem as mãos vazias apenas quando se fala no significado do karate.
Experiência a serviço da juventude
A febre do MMA, que é a sigla em inglês para artes marciais mistas, já faz do Rio Grande do Norte um dos estados com bons nomes no quadro de competidores do Ultimate Fight Championship, o conhecido o UFC. Renan Barão e Gleidson Tibau são alguns dos potiguares que veem fazendo bonito na maior competição de artes marciais do mundo. Porém, outro potiguar teve participação direta em uma das principais lutas do UFC em 2011: o mestre Juarez Soares. Ninguém menos do que o ex-campeão do Pride e UFC na categoria meio-pesado, Lyoto Machida, pediu conselhos ao carateca potiguar.
Um dos principais nomes do UFC, Machida é um dos poucos que têm no karate sua principal arte marcial. Enquanto a maior parte dos lutadores são especialistas em muay-thai, jiu-jitsu e wrestling, o lutador nascido em Salvador e radicado em Belém mantém os treinamentos também na modalidade que o alavancou para o mundo do MMA. "Ele é um bom carateca e soube se adaptar bem ao MMA", avalia Juarez Alves, que conhece o Lyoto através do mestre Machida, pai do lutador. "Lyoto me tinha como ídolo no karate", comemora o mestre.
Antes de conhecer Lyoto Machida, Juarez Alves tinha um pensamento diferente sobre o MMA. Para ele, era um esporte muito semelhante à briga de rua e não sabia sobre a formação dos atletas. O pensamento fez com que ele não deixasse o filho ir para o Japão junto com o "filho de Machida" para iniciar treinamentos voltados ao então vale-tudo. "Mas quando eu conheci Lyoto, vi que ele é um rapaz extremamente educado e que é um atleta exemplar".
Antes de encarar Jon Jones na disputa pelo título dos meio-pesados, Lyoto Machida esteve em Natal para encontrar com amigos e aproveitou para conversar com mestre Alves. No papo, o lutador pediu conselhos sobre como poderia anular os golpes de alto alcance do americano, que terminou vencendo a luta por finalização. "Preparei um vídeo com meu filho com algumas dicas e enviei por e-mail. Ele agradeceu bastante", disse Alves.
Se por um lado o mestre carateca hoje vê com bons olhos o MMA, ele acredita que é algo que vai demandar uma reciclagem ainda maior por parte dos mestres e dos praticantes do karate. "O karate tem que ser melhor trabalhado para também fazer a diferença no MMA. Mas, para chamar os alunos para praticar, é preciso que os mestres lembrem que o karate forma mais do que um lutador. Forma homens e mulheres de bem", finalizou.
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