Por: Marcelo Brandão
A batalha
diária dos artistas para conseguir espaço não é algo novo no Brasil, tampouco a
sua reconhecida qualidade. Mesmo com a ajuda do governo, no entanto, muitos
ainda patinam no meio da burocracia para conseguir viver da arte. A Lei 8.313, conhecida
como Lei Rouanet, que instituiu incentivos fiscais para empresas que investirem
em projetos artísticos, funciona melhor com nomes consagrados. De acordo com
seu texto, a empresa que patrocinar o projeto – aprovado previamente pelo
Ministério da Cultura (MinC) – de um artista pode deduzir o valor investido do
Imposto de Renda, até o limite de 4%.
Muitos
artistas procuram financiamento com base na lei e conseguem a aprovação de seus
projetos. A etapa mais difícil, no entanto, está na captação dos recursos.
Artistas desconhecidos e grupos de arte popular disputam com nomes já
consagrados o investimento das empresas e reclamam da falta de um mecanismo
legal que impeça uma concorrência considerada por eles desleal. A crítica dos
artistas não é nova. Houve um debate sobre o tema no setor há cerca de cinco
anos, mas nada mudou.
O músico
brasiliense Alex Lima passou o ano de 2014 planejando a gravação de um CD e de
um videoclipe. Pagou R$ 2 mil pelos serviços de uma empresa especializada
apenas na preparação de projetos e conseguiu a aprovação pela Lei Rouanet. “Foi
nesse ponto que eu esbarrei em outra brecha negativa do sistema. As empresas
que desenvolvem, aprovam e depois captam os recursos são mais caras ainda. As
mais baratas apenas dão entrada e devolvem o projeto aprovado, e o artista se
vira com a captação”, explicou. Todos os projetos, no entanto, têm um prazo
para que se capte o recurso. O prazo de Lima está próximo de se esgotar,
faltando menos de dois meses.
Coordenador
de um grupo de percussão em Minas Gerais, o músico Daniel Melão procurou na Lei
Rouanet uma forma de financiar seu projeto, no qual ensina maracatu
gratuitamente em Belo Horizonte. Mesmo pedindo uma verba considerada pequena,
cerca de R$ 70 mil, não conseguiu o dinheiro. “Cheguei à conclusão de que, para
esse tipo de projeto, pela Lei Rouanet, eu estava tentando no lugar errado. Não
é de interesse dessas grandes empresas, potenciais patrocinadoras, vincular o
nome a uma proposta que não é um megaprojeto”.
Envolvido em
projetos pessoais e de instituições culturais, Melão decidiu não tentar
viabilizar mais projetos por meio da Lei Rouanet. “No formato atual, é
impossível o artista fazer essa correria burocrática para conseguir verba e ser
artista ao mesmo tempo. Eu estudo todos os dias, dou aulas todos os dias, e se
eu tiver que parar para correr atrás de burocracia e bater à porta de empresas,
a última coisa que vou ser é um artista. Vou estagnar a minha arte e virar um
gestor de projeto cultural”.
Ricardo
Trento é presidente da organização não governamental paranaense Unicultura, que
auxilia artistas na captação de recursos. Para ele, o que precisa mudar não é a
lei, mas sim a forma de os artistas venderem seus projetos às empresas. Trento
acredita que o artista precisa encarar seu projeto cultural como uma pequena
empresa, para que possa obter os recursos e se preocupar apenas com sua arte.
Trento
acredita que o artista não pode tratar a empresa como alguém que vá fazer um
favor. Conseguir o recurso passa pela apresentação de um projeto que também
seja interessante para a empresa. “Eu não posso chegar lá com cara de que
carrego o piano, apesar de carregar o piano. A gente trabalha com artistas
desconhecidos e consegue fazer captação de recursos porque apresentamos para o
patrocinador um projeto que tenha aderência, que fale a mesma linguagem que a
empresa quer ouvir”. Ele reconhece, no entanto, que muitas empresas ainda não
estão preparadas para analisar projetos e decidir em quem investir.
Pode faltar
interesse das empresas ou até mesmo projetos que atraiam o interesse do
mercado, mas o que não há é falta de projetos autorizados. O problema é
concretizá-los. De acordo com levantamento divulgado anualmente pela Secretaria
de Fomento e Incentivo à Cultura, do MinC, mesmo os artistas que chegam a
conseguir algum recurso, captam menos do que o valor autorizado pelo
ministério. Durante o ano de 2013, os projetos que conseguiram captação de
verbas tinham autorização para chegar a R$ 4,3 bilhões. Desse valor, porém,
apenas R$ 1,2 bilhão chegou a esses artistas.
Procurado
pela reportagem, o MinC informou à Agência Brasil que existe um projeto de lei
em tramitação no Congresso Nacional para reformar a Lei Rouanet, mas não
explicou como as propostas do novo texto podem resolver a queixa dos jovens
artistas.
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