"Sou
uma pessoa que me dediquei de corpo e alma à Polícia,
deixando
inclusive minha família em segundo plano”.
Por: Danilo Sá / Déborah Fernandes
O “Xerife”.
Durante anos, foi assim que ficou conhecida uma das figuras mais marcantes do
cenário policial potiguar. O eterno delegado Maurílio Pinto de Medeiros, 73,
está aposentado há cerca de dois anos, após se dedicar quase cinco décadas de
vida à Polícia Civil potiguar. Desse tempo, durante 21 temporadas, ocupou os
mais altos postos da instituição, inclusive os de subsecretário e secretário
adjunto de Segurança Pública.
Mas, apesar
de ter se afastado do trabalho e das sequelas de um Acidente Vascular Cerebral
(AVC) sofrido há cerca de 15 anos, o que lhe tirou parte dos movimentos do lado
esquerdo do corpo, ainda aparenta a mesma seriedade dos tempos em que
intimidava os bandidos do Estado apenas ao fazê-los ouvir seu nome.
Em sua casa,
no escritório que acabou sendo transformado em seu novo gabinete, o “Xerife”
recebeu a reportagem d’O Jornal de Hoje para uma longa conversa. Reconheceu a
influência do tráfico de drogas no grande número de assassinatos no Estado;
lamentou existir policiais envolvidos com a marginalidade; e reconheceu ter
realizado escutas consideradas “ilegais” pelo Ministério Público. “Só fiz
ajudar a população e a Justiça na solução de diversos crimes”, completa.
“Eu sou uma
pessoa que me dediquei de corpo e alma à Polícia, deixando inclusive minha
família em segundo plano. Eu costumo dizer que casei duas vezes, uma com minha
mulher e outra vez com a Polícia, e os dois em 1964. Mas a minha vida foi a
Polícia”, disse Maurílio Pinto. Leia, abaixo, um pouco mais sobre essa relação
que dura até hoje.
O JORNAL DE HOJE – O
Rio Grande do Norte registrou em 2013, 1.636 homicídios. Esse ano já estamos
chegando quase a 200 assassinatos. Na sua opinião, porque a violência cresceu
tanto no nosso Estado?
MAURÍLIO PINTO
– Em primeiro lugar, existe a droga. Esse problema que não predomina só aqui no
Estado, mas em todos os estados brasileiros. Em segundo, especificamente no RN,
nós temos uma deficiência muito grande no número de efetivos. A Polícia
Militar, encarregada de fazer o policiamento ostensivo, é muito pequena. Apesar
de tudo isso, o comandante tem se desdobrado mesmo com toda essa deficiência, e
vem tentando contornar o problema.
JH – Qual o tamanho da
responsabilidade do tráfico de drogas com relação a tanta violência?
MP – Como eu
falei anteriormente, a droga é um problema muito sério. Nós temos uma Delegacia
de Narcóticos (Dnarc), mas tinha que se dar mais efetivo aos policiais das
distritais para eles se empenharem também no combate à droga. Porque normalmente
essas delegacias tem o grande defeito do policial dizer ‘não isso aí é da
delegacia de entorpecentes, a gente não vai se meter’. Ora, eles que têm o
conhecimento de suas jurisdições é que devem combater até melhor do que a
Delegacia de Narcóticos. Mas, não fazem isso. Eles deixam a responsabilidade
para a Dnarc ou para a Polícia Federal, que também faz esse combate.
JH – O que precisa ser
feito para o Estado voltar a ser considerado uma região segura?
MP –
Primeiramente aumentar o número de efetivos das Polícias. Isso aí é
indispensável. Aqui no Estado o efetivo é muito pequeno tanto da Civil quanto
da Militar. E também deve ser dado mais estímulo para os próprios policiais.
Muitos deles não vestem a camisa. Antigamente quando não existia a diária operacional,
os policiais se dedicavam mais. Hoje existe essa diária e isso concorre para
muitos não querer trabalhar. Eles só trabalham se tiver o dinheiro na frente.
Se preocupam mais com o dinheiro do que em combater, fazer o seu trabalho.
JH – Muitas críticas
têm sido feitas a falta de investimentos nas polícias, tanto Civil quanto
Militar. Faltam recursos?
MP – Faltam
recursos também, mas por incrível que pareça existem mais incentivos que no
passado. Tem aumentado o número de viaturas, mas mesmo assim a falta é grande.
Precisamos cada vez mais de incentivo. Mais armamento, viaturas, investimentos
no setor de investigação, tá faltando muita coisa ainda.
JH – O sindicato da
Polícia Civil afirma que apenas 5% dos crimes são investigados hoje no RN. Qual
a opinião do senhor sobre isso? A impunidade aumenta a violência?
MP – Claro
que aumenta. É bom deixar bem claro que isso não acontece só aqui é em todo o
brasil. O problema é muito sério. Hoje o bandido comete o crime, percebe que a
polícia não consegue solucionar e aí começam a fazer mais e mais. Isso é
preocupante.
JH – O delegado
Maurílio Pinto é lembrado até hoje pela dureza com que tratava os bandidos.
Hoje falta um Maurílio Pinto à frente da segurança pública do Estado?
MP – Eu sou
uma pessoa que me dediquei de corpo e alma à Polícia, deixando inclusive minha
família em segundo plano. Eu costumo dizer que casei duas vezes, uma com minha
mulher e outra vez com a Polícia, e os dois em 1964. Mas a minha vida foi a
polícia. (risos) Eu tenho saudade do tempo em que a polícia usava a palmatória.
Teve uma época aqui que até pelo telefone a gente fazia uma intimação. Hoje o
que eu sinto mais falta é do rigor que a Polícia tinha, se agia com mais
seriedade. Os crimes eram solucionados porque existia isso. Hoje a gente sabe
tranquilamente da participação de alguns elementos da Polícia envolvidos em
crimes.
JH – Qual a sua relação
com os grupos de Direitos Humanos do Estado?
MP – Eu
particularmente me relaciono muito bem com os grupos de Direitos Humanos daqui
e até me considero um defensor dos Direitos Humanos. Mas existe um grupo que me
persegue muito e que se chama Centro de Direitos Humanos e Memória Popular.
Desde o começo me perseguem. Eu recebi uma comenda de Xerife do estado do
Maine, nos Estados Unidos. E eles enviaram um ofício para o governador do Maine
pedindo para que fosse cancelada a comenda, alegando que eu era acusado de
cometer mais de 60 crimes aqui no Estado. Bom, eu até posso afirmar que matei
alguns bandidos em troca de tiros, mas se foram 60 eu não sei dizer. Os crimes
que eu fiz, foi exatamente para elucidar aqueles sem solução.
JH – O senhor está
respondendo por 27 ações de improbidade administrativa no caso de escutas
telefônicas ilegais, conhecido como ‘Caso Guardião’. O que o senhor tem para
falar sobre esse assunto?
MP –
Inclusive o julgamento será dia 12 de março deste ano. Bom, o Ministério
Público sabe, eu dei depoimento sobre isso, confirmando que fiz e se eu pudesse
eu faria novamente. Não cometi nenhuma ilegalidade, pelo contrário, só fiz
ajudar a população e a Justiça na solução de diversos crimes. Na realidade o
problema era o seguinte, eu tinha autorização judicial do Dr. Carlos Adel. Eu
sabia de um determinado fato, solicitava a ele as escutas telefônicas. O
problema é que eu não seguia os trâmites legais. Porque eu preciso ter a
autorização do Ministério Público e aí então, passar para o juiz que liberava
ou não as escutas. Mas muitas vezes eu não podia esperar tudo isso acontecer.
Muitas vezes eu tinha que ter essa informação rapidamente e se fosse esperar
por todo esse trâmite eu não resolveria o problema. Eu me recordo de um fato
que foi o sequestro da filha do então vereador Sid Fonseca, que a gente tinha
que fazer a interceptação naquela madrugada. Como é que eu ia conseguir
autorização do MP? Então eu fiz um ofício, encaminhei ao Dr. Carlos Adel,
mandei deixar na casa de praia, onde ele estava, ele autorizou, e a gente
evitou a morte da garota. Eles alegaram que foram 1.684 interceptações, eu
sinceramente não lembro, mas confirmei que fiz todas. Foram anos fazendo isso.
Não nego de jeito nenhum.
JH – Apesar da
aposentadoria o senhor ainda trabalha? Mantém relações com a Polícia?
MP – Mesmo
aposentado eu recebo muitas ligações, denúncias e até informações de crimes e
repasso para alguns colegas da inteligência da Polícia. Eu trabalho em casa.
Esse escritório eu chamo de gabinete. Eu sou muito procurado pela população por
coisas importantes, mas tem dia que vem gente aqui pedindo para eu resolver
problemas muito simples.
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