segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

MAURÍLIO AFIRMA EXISTIR POLICIAIS NO CRIME E COBRA MAIS SERIEDADE NO EXERCÍCIO DA PROFISSÃO

"Sou uma pessoa que me dediquei de corpo e alma à Polícia,
deixando inclusive minha família em segundo plano”.

Por: Danilo Sá / Déborah Fernandes

O “Xerife”. Durante anos, foi assim que ficou conhecida uma das figuras mais marcantes do cenário policial potiguar. O eterno delegado Maurílio Pinto de Medeiros, 73, está aposentado há cerca de dois anos, após se dedicar quase cinco décadas de vida à Polícia Civil potiguar. Desse tempo, durante 21 temporadas, ocupou os mais altos postos da instituição, inclusive os de subsecretário e secretário adjunto de Segurança Pública.

Mas, apesar de ter se afastado do trabalho e das sequelas de um Acidente Vascular Cerebral (AVC) sofrido há cerca de 15 anos, o que lhe tirou parte dos movimentos do lado esquerdo do corpo, ainda aparenta a mesma seriedade dos tempos em que intimidava os bandidos do Estado apenas ao fazê-los ouvir seu nome.

Em sua casa, no escritório que acabou sendo transformado em seu novo gabinete, o “Xerife” recebeu a reportagem d’O Jornal de Hoje para uma longa conversa. Reconheceu a influência do tráfico de drogas no grande número de assassinatos no Estado; lamentou existir policiais envolvidos com a marginalidade; e reconheceu ter realizado escutas consideradas “ilegais” pelo Ministério Público. “Só fiz ajudar a população e a Justiça na solução de diversos crimes”, completa.

“Eu sou uma pessoa que me dediquei de corpo e alma à Polícia, deixando inclusive minha família em segundo plano. Eu costumo dizer que casei duas vezes, uma com minha mulher e outra vez com a Polícia, e os dois em 1964. Mas a minha vida foi a Polícia”, disse Maurílio Pinto. Leia, abaixo, um pouco mais sobre essa relação que dura até hoje.

O JORNAL DE HOJE – O Rio Grande do Norte registrou em 2013, 1.636 homicídios. Esse ano já estamos chegando quase a 200 assassinatos. Na sua opinião, porque a violência cresceu tanto no nosso Estado?

MAURÍLIO PINTO – Em primeiro lugar, existe a droga. Esse problema que não predomina só aqui no Estado, mas em todos os estados brasileiros. Em segundo, especificamente no RN, nós temos uma deficiência muito grande no número de efetivos. A Polícia Militar, encarregada de fazer o policiamento ostensivo, é muito pequena. Apesar de tudo isso, o comandante tem se desdobrado mesmo com toda essa deficiência, e vem tentando contornar o problema.

JH – Qual o tamanho da responsabilidade do tráfico de drogas com relação a tanta violência?

MP – Como eu falei anteriormente, a droga é um problema muito sério. Nós temos uma Delegacia de Narcóticos (Dnarc), mas tinha que se dar mais efetivo aos policiais das distritais para eles se empenharem também no combate à droga. Porque normalmente essas delegacias tem o grande defeito do policial dizer ‘não isso aí é da delegacia de entorpecentes, a gente não vai se meter’. Ora, eles que têm o conhecimento de suas jurisdições é que devem combater até melhor do que a Delegacia de Narcóticos. Mas, não fazem isso. Eles deixam a responsabilidade para a Dnarc ou para a Polícia Federal, que também faz esse combate.

JH – O que precisa ser feito para o Estado voltar a ser considerado uma região segura?

MP – Primeiramente aumentar o número de efetivos das Polícias. Isso aí é indispensável. Aqui no Estado o efetivo é muito pequeno tanto da Civil quanto da Militar. E também deve ser dado mais estímulo para os próprios policiais. Muitos deles não vestem a camisa. Antigamente quando não existia a diária operacional, os policiais se dedicavam mais. Hoje existe essa diária e isso concorre para muitos não querer trabalhar. Eles só trabalham se tiver o dinheiro na frente. Se preocupam mais com o dinheiro do que em combater, fazer o seu trabalho.

JH – Muitas críticas têm sido feitas a falta de investimentos nas polícias, tanto Civil quanto Militar. Faltam recursos?

MP – Faltam recursos também, mas por incrível que pareça existem mais incentivos que no passado. Tem aumentado o número de viaturas, mas mesmo assim a falta é grande. Precisamos cada vez mais de incentivo. Mais armamento, viaturas, investimentos no setor de investigação, tá faltando muita coisa ainda.

JH – O sindicato da Polícia Civil afirma que apenas 5% dos crimes são investigados hoje no RN. Qual a opinião do senhor sobre isso? A impunidade aumenta a violência?

MP – Claro que aumenta. É bom deixar bem claro que isso não acontece só aqui é em todo o brasil. O problema é muito sério. Hoje o bandido comete o crime, percebe que a polícia não consegue solucionar e aí começam a fazer mais e mais. Isso é preocupante.

JH – O delegado Maurílio Pinto é lembrado até hoje pela dureza com que tratava os bandidos. Hoje falta um Maurílio Pinto à frente da segurança pública do Estado?

MP – Eu sou uma pessoa que me dediquei de corpo e alma à Polícia, deixando inclusive minha família em segundo plano. Eu costumo dizer que casei duas vezes, uma com minha mulher e outra vez com a Polícia, e os dois em 1964. Mas a minha vida foi a polícia. (risos) Eu tenho saudade do tempo em que a polícia usava a palmatória. Teve uma época aqui que até pelo telefone a gente fazia uma intimação. Hoje o que eu sinto mais falta é do rigor que a Polícia tinha, se agia com mais seriedade. Os crimes eram solucionados porque existia isso. Hoje a gente sabe tranquilamente da participação de alguns elementos da Polícia envolvidos em crimes.

JH – Qual a sua relação com os grupos de Direitos Humanos do Estado?

MP – Eu particularmente me relaciono muito bem com os grupos de Direitos Humanos daqui e até me considero um defensor dos Direitos Humanos. Mas existe um grupo que me persegue muito e que se chama Centro de Direitos Humanos e Memória Popular. Desde o começo me perseguem. Eu recebi uma comenda de Xerife do estado do Maine, nos Estados Unidos. E eles enviaram um ofício para o governador do Maine pedindo para que fosse cancelada a comenda, alegando que eu era acusado de cometer mais de 60 crimes aqui no Estado. Bom, eu até posso afirmar que matei alguns bandidos em troca de tiros, mas se foram 60 eu não sei dizer. Os crimes que eu fiz, foi exatamente para elucidar aqueles sem solução.

JH – O senhor está respondendo por 27 ações de improbidade administrativa no caso de escutas telefônicas ilegais, conhecido como ‘Caso Guardião’. O que o senhor tem para falar sobre esse assunto?

MP – Inclusive o julgamento será dia 12 de março deste ano. Bom, o Ministério Público sabe, eu dei depoimento sobre isso, confirmando que fiz e se eu pudesse eu faria novamente. Não cometi nenhuma ilegalidade, pelo contrário, só fiz ajudar a população e a Justiça na solução de diversos crimes. Na realidade o problema era o seguinte, eu tinha autorização judicial do Dr. Carlos Adel. Eu sabia de um determinado fato, solicitava a ele as escutas telefônicas. O problema é que eu não seguia os trâmites legais. Porque eu preciso ter a autorização do Ministério Público e aí então, passar para o juiz que liberava ou não as escutas. Mas muitas vezes eu não podia esperar tudo isso acontecer. Muitas vezes eu tinha que ter essa informação rapidamente e se fosse esperar por todo esse trâmite eu não resolveria o problema. Eu me recordo de um fato que foi o sequestro da filha do então vereador Sid Fonseca, que a gente tinha que fazer a interceptação naquela madrugada. Como é que eu ia conseguir autorização do MP? Então eu fiz um ofício, encaminhei ao Dr. Carlos Adel, mandei deixar na casa de praia, onde ele estava, ele autorizou, e a gente evitou a morte da garota. Eles alegaram que foram 1.684 interceptações, eu sinceramente não lembro, mas confirmei que fiz todas. Foram anos fazendo isso. Não nego de jeito nenhum.

JH – Apesar da aposentadoria o senhor ainda trabalha? Mantém relações com a Polícia?

MP – Mesmo aposentado eu recebo muitas ligações, denúncias e até informações de crimes e repasso para alguns colegas da inteligência da Polícia. Eu trabalho em casa. Esse escritório eu chamo de gabinete. Eu sou muito procurado pela população por coisas importantes, mas tem dia que vem gente aqui pedindo para eu resolver problemas muito simples.


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