quarta-feira, 24 de julho de 2013

EU RECOMENDO: VANESSA DA MATA CANTA TOM JOBIM


Se você disser que Vanessa da Mata desafina ao cantar as 16 músicas de Antonio Carlos Jobim (1927 - 1994) reunidas no CD que a Sony Music põe nas lojas a partir desta quinta-feira, 4 de julho, saiba que isso é mentira. Blindada pelas modernas tecnologias de gravação, a cantora apresenta disco levemente superior ao controvertido espetáculo que o originou.

Produzido por Kassin, o registro de estúdio do show idealizado para o projeto Nívea viva Tom Jobim - ao qual a cantora dá continuidade em turnê que segue pelo Brasil neste segundo semestre de 2013 -  atenua quase sempre as eventuais inadequações da artista ao cancioneiro de Jobim por conta do tom jovial que pontua e valoriza o disco. A inusitada interação do maestro e pianista Eumir Deodato - arregimentado para fazer os arranjos - com a turma de músicos convocada por Kassin (o baixista Alberto Continentino, o tecladista Danilo Andrade, o guitarrista Gustavo Ruiz e o baterista Stephane San Juan, entre outros) deu à abordagem de Jobim pela cantora um frescor que, sim, pode aproximar a obra soberana de Tom de um público mais jovem e mais distante desse cancioneiro.

Já que o disco apresenta somente 16 das 24 músicas do roteiro original do show, Vanessa poderia ter ignorado músicas de maior carga emocional para a qual não tem voz e vocação, sobretudo Por causa de você (Antonio Carlos Jobim e Dolores Duran, 1957), pior momento do álbum. A cantora também poderia ter baixado o tom de Dindi (Antonio Carlos Jobim e Aloysio de Oliveira, 1959) em algumas passagens da canção conduzida pelo piano de Danilo Andrade. Até porque o grande trunfo do disco é a leveza imprimida nas interpretações e nos arranjos de músicas como Só danço samba (Antonio Carlos Jobim e Vinicius de Moraes, 1962), Este seu olhar (Antonio Carlos Jobim, 1959), Wave (Antonio Carlos Jobim, 1967) - numa onda bem próxima do som que se convencionou rotular como bossa nova - e Caminhos Cruzados (Antonio Carlos Jobim e Newton Mendonça, 1958).

Inseridas no universo bucólico que remete às origens da artista nascida e criada em cidade do interior de Mato Grosso, Chovendo na roseira (Antonio Carlos Jobim, 1971) e Correnteza (Antonio Carlos Jobim e Luiz Bonfá, 1973) também se ajustam bem ao tom de Vanessa. Já Sabiá (Antonio Carlos Jobim e Chico Buarque, 1968) voa baixo porque, no canto de Mata, se perde todo o sentido político dos versos de Chico. Em contrapartida, Eu sei que vou te amar (Antonio Carlos Jobim e Vinicius de Moraes, 1959) é ambientada em clima de bolero em ousadia estilística que preserva o tom apaixonado da canção. Aliás, a produção de Kassin jamais inventa moda a ponto de desconfigurar o cancioneiro perfeito de Jobim.

Há até um diálogo sutil com a linguagem musical da Banda Nova - o grupo que dividiu o palco com Jobim a partir de 1984 - em faixas como Só tinha de ser com você (Antonio Carlos Jobim e Aloysio de Oliveira, 1964). Ao executar os arranjos de Deodato com os músicos recrutados para a gravação (feita de 5 a 8 de abril de 2013, dias antes da estreia nacional do show no Rio de Janeiro), Kassin se limita a criar sonoridade mais atual para uma obra que em si já soa eternamente nova por conta de sua perene modernidade.


Enfim, Vanessa da Mata canta Tom Jobim resulta digno. Está longe de ser um registro antológico do cancioneiro de Jobim - até porque músicas como Samba de uma nota só (Antonio Carlos Jobim e Newton Mendonça, 1959) já mereceram dezenas de registros superiores de intérpretes mais identificados com a obra do maestro - mas tampouco depõe contra a discografia de Vanessa da Mata. De todo modo, que venha logo o álbum de inéditas autorais gravado em 2012 pela cantora e (boa) compositora com produção de Kassin e Liminha.

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