A vitrine
inteira da livraria Mondadori, no bairro medieval de Santa Maria Novella, em
Florença, exibe cópias de "Inferno". E nem é a livraria local
preferida de Robert Langdon, o protagonista do novo romance de Dan Brown, que
se passa em boa parte na cidade italiana.
Esta, a
Paperback Exchange, colocou em seu site um trecho do romance em que é citada.
Não é pouca coisa ser uma livraria querida por um personagem cujas três
aventuras pregressas já venderam 150 milhões de exemplares.
Desde 2003,
quando lançou seu maior best-seller, "O Código Da Vinci", o escritor
norte-americano está acostumado a causar comoções. E continua alimentando-as.
A campanha
em torno de "Inferno" incluiu a informação de que tradutores de
vários países verteram a obra isolados num bunker, a fim de evitar vazamentos
da trama.
"Hoje é
meu momento, amanhã pode não ser", disse Brown à Folha, em Florença, onde
passou dias atendendo à imprensa mundial, ao comentar a campanha de marketing
do livro, que lidera listas internacionais há duas semanas, inclusive no
Brasil.
Pouco antes,
após cumprimentar seu editor brasileiro, Marcos Pereira, da Sextante, disse:
"Estou cansado. Falta só uma semana [de entrevistas]".
O sexto
romance de Brown --o quarto protagonizado pelo professor de simbologia Robert
Langdon-- tem como inspiração "A Divina Comédia", de Dante Alighieri,
e discute a superpopulação no planeta. Leia, a seguir, trechos da entrevista.
FOLHA - Em "Inferno", o Sr.
usa como base uma obra literária, "A Divina Comédia", de Dante. Como
foi essa experiência?
Dan Brown - Já tinha escrito sobre artes
plásticas, nunca sobre literatura. Foi empolgante. Dante dá margem a uma enorme
gama de interpretações. Resolvi não interpretar a obra dele, mas deixar esse
trabalho para o personagem Bertrand Zobrist, engenheiro genético fanático pela
catástrofe da superpopulação. Para mim, tratava-se de juntar o velho mundo de
Dante com o novo mundo da engenharia genética. Pensei num vilão que visse Dante
não como história, mas como profecia, que olhasse para a descrição de horror
pensando: "Isso vai acontecer". No segundo em que fiz essa conexão,
eu tinha o livro.
É irônico que o personagem seja
um vilão, já que o que o move é salvar o planeta, não?
O vilão mais
interessante é aquele que faz a coisa errada pela razão certa. Alguém sobre quem
você pensa: "Eu não espalharia um vírus intencionalmente para acabar a
superpopulação, mas ele tem um ponto aqui". O leitor fica sem saber para
onde ir.
Sua visão coincide com a dele?
Em 85 anos,
a população do mundo triplicou. Nascem 250 mil pessoas a cada dia. Eu me
preocupo. Sei que problemas como desmatamento, poluição, buraco na camada de
ozônio e fome estão ligados à superpopulação. O que fazer a respeito é algo
impossível de responder. Se tivesse a resposta, não estaria escrevendo
romances.
A trama cita Dante: "Os
lugares mais sombrios do inferno são reservados àqueles que se mantiveram
neutros em tempos de crise moral". O sr. não se mantém neutro no livro?
É uma
observação interessante. Não sei se mantenho a neutralidade, mas está certo:
esse não é um livro ativista. Não manter a neutralidade tem a ver com escrever
sobre o problema. Você tem razão sobre o posicionamento narrativo, mas acho que
não mantenho a neutralidade porque quem termina o livro pensa a respeito. Não
digo o que temos de fazer porque não sei o que temos de fazer.
Por que tanta preocupação prévia
com a trama, ao ponto de manter tradutores isolados para a história não vazar?
Depois do
"Código Da Vinci", passei a ter acesso a lugares e a pessoas que
antes eram inacessíveis, mas ficou difícil manter segredo sobre o que escrevo.
Gosto de manter segredo. Quando entrevisto especialistas, faço perguntas sobre
temas nada relacionados aos romances. No caso de "Inferno", jogava o
nome de Dante como se tivesse acabado de me ocorrer. Para deixar a pessoa sem
pistas, falava: "Quero saber de Maquiavel. Maquiavel é o que
importa".
Seus livros costumam gerar
reações agressivas, inclusive de sites que listam erros. Como lida com isso?
Não gasto
energia. Alguns adoram e escrevem coisas boas, outros odeiam e fazem piadas.
Temos um exército de checadores antes do lançamento para garantir que nada saia
errado, mas pequenos erros passam, e as pessoas levam muito a sério.
"Inferno" saiu com
forte campanha de marketing num tempo em que a autopublicação gera fenômenos no
boca a boca. O sr. ainda precisa de marketing?
Hoje é meu
momento, amanhã pode não ser. O marketing ajuda o livro a atingir uma massa
crítica até gente o suficiente ler e começar a sugerir aos amigos. No fim, só
vão vender os livros de que as pessoas gostarem. Nenhum marketing vai criar
"Harry Potter". Escrevi três livros que ninguém leu antes de "O
Código". E hoje eles são best-sellers no mundo todo. Não mudei uma vírgula
e venderam milhões. Ninguém vai negar que o marketing foi importante para isso.
"O Símbolo Perdido"
(2009) virou um caso notório de pirataria de e-books, com 100 mil downloads
ilegais em poucos dias. Isso o incomoda?
A pirataria
prejudica as editoras. Best-sellers dão dinheiro às editoras, que com isso
podem lançar obras que não vendam tanto: um livro que represente uma voz
importante, mas que não tenha potencial de venda. Alguns gostam do que faço,
outros preferem ler outra coisa. Livros como "Inferno" ajudam as
editoras a publicar outras coisas.
Suas tramas sempre trazem Langdon
enfrentando, com uma mulher diferente, um desafio a ser resolvido em poucas
horas. Podemos esperar algo diferente?
Escrevo com
uma intenção específica: o importante é a história. Quero ser transparente,
fazer a história fluir. Tento comprimir as histórias num curto período para
garantir que nenhuma ponta esteja solta. E não há tensão maior que a sexual.
Langdon encontra essas mulheres, eles gostam um do outro e não têm tempo para
consumar suas relações. Você quer que eles fiquem juntos, mas isso não vai
acontecer.
A resenhista da "New
Yorker" levantou a suspeita de que Langdon seja gay.
Eu vi
(risos). Mas acho que é só azar mesmo.
Fonte: UOL
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