O português
José Saramago (1922-2010) era movido especialmente por questões humanitárias
quando escrevia. Assim, em 2009, quando ainda lutava contra uma grave doença,
iniciou o rascunho de um romance no qual trataria do comércio de armas. O ponto
de partida era uma história que julgava ter lido no romance L’Espoir, de André
Malraux: uma bomba lançada durante a Guerra Civil Espanhola que, além de não
ter explodido, ainda ganhou um bilhete irônico: “Esta bomba não explodirá”.
Assim,
aliada à questão que o intrigava de não conhecer nenhum caso de greve na
indústria armamentista, a história inspirou o romance Alabardas, Alabardas,
Espingardas, Espingardas, do qual Saramago escreveu apenas os três primeiros
capítulos, interrompidos pela morte do escritor, em junho de 2010.
“O que
estava escrito era uma versão definitiva. O romance poderia não estar completo,
mas o que agora é publicado é um texto acabado. A morte não o interrompeu -
Saramago deixou de escrever porque necessitava mudar de caminho, o que exigia uma
investigação. Ele estava nesse ponto quando a morte lhe chegou”, conta Pilar
del Río, mulher do escritor, justificando a publicação do livro, lançado aqui
pela Companhia das Letras, ao mesmo tempo em que saem edições em Portugal e
também em espanhol.
Todas
versões trazem textos do ensaísta espanhol Fernando Gómez Aguilera, do escritor
italiano Roberto Saviano (Gomorra, Zero Zero Zero), além de ilustrações do
romancista alemão Günter Grass. A brasileira é mais fornida, pois reproduz
artigo do antropólogo Luiz Eduardo Soares. “Esses coautores foram escolhidos
pela proximidade afetiva e intelectual”, conta Pilar.
Aguilera
acompanhou pessoalmente o processo criativo, visitando o casal em sua
residência. “Quando trabalhou como editor, Saramago publicou os livros de
Günter e o admirava como poucos”, completa Pilar. “Já Luis Eduardo tem ideias
muito claras sobre violência e a resposta que a sociedade pode dar, o que era
absolutamente necessário.”
Os três
capítulos deixados por Saramago apresentam Artur Paz Semedo, trabalhador da
fábrica de armas Produções Belona S.A. Funcionário exemplar, nunca questionou a
finalidade dos produtos que ajuda a construir, o que provoca irritação de sua
mulher, Felícia, pacifista radical.
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