Soldado
lotado na Casa Militar, ele recebeu a missão de dirigir para o secretário de
Cultura, com quem aprendeu mais sobre literatura e humildade.
Era meio-dia
e quarenta minutos do sábado, 19 de julho de 2014. Juscelino deixou Ariano e
Dona Zélia em casa e se despediu do casal pela última vez. Levava no bolso uma
carta endereçada ao mestre, escrita meses antes, que nunca chegou a ser
entregue. Passou muito tempo ensaiando o momento, escolhendo as palavras,
imaginando como introduziria o assunto. Quando chegou à Rua do Chacon, nº 328,
a família preparava uma celebração para o aniversário de Zélia de Andrade Lima
Suassuna, comemorado naquela data. Achou que não seria conveniente. Saiu
levando a carta consigo.
Aquela não
foi a primeira vez que o motorista desejou pôr o texto nas mãos do chefe. Na
noite anterior, em Garanhuns – onde o escritor, dramaturgo e secretário de
Estado Ariano Suassuna, 87 anos, havia realizado a sua última aula-espetáculo
–, o soldado Juscelino Moura, 40 anos, lotado na Casa Militar de Pernambuco,
designado para servir ao mestre, chegou a fazer uma tentativa. Mas os músicos
que acompanhavam Ariano nas aulas-espetáculo estavam muito felizes com a sua
presença. Zoca Madureira e Jerimum de Olinda conversavam animadamente com autor
paraibano mais pernambucano de todos. Novamente, não sentiu a ocasião
favorável. Dormiu de posse da carta.
Foram muitas
idas e vindas com aquela página impressa na iminência de chegar ao seu
destinatário. A última versão traz no cabeçalho o dia 17 de março de 2014.
Seria entregue caso o secretário deixasse o cargo simultaneamente ao governador
Eduardo Campos, que se desincompatibilizou em abril para concorrer à presidência
da República. O futuro do soldado com o escritor teria, então, os dias
contados. Quis o destino que o novo administrador, João Lyra Neto, estendesse a
convivência mais um pouquinho. Quis o destino, outra vez, que o encontro entre
ambos terminasse abruptamente naquele 19 de julho. Dois dias depois, numa
segunda-feira à noite, Ariano era internado no Real Hospital Português por
causa de um acidente vascular cerebral. Morreu na unidade de saúde no dia 23 de
julho. Era uma quarta-feira. Chovia no Recife.
(***) FONTE: Jornal do Commercio
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