segunda-feira, 4 de agosto de 2014

NOVA EDIÇÃO DE AS VIRGENS SUICIDAS OBRIGA RELEITURA DESTE CLÁSSICO CULT

História da morte de cinco irmãs adolescentes é contada por meninos da vizinhança,
em meio a descoberta do sexo e do amor

Por: Conrado Carlos

As Virgens Suicidas seduz logo pelo enredo. Cinco irmãs, com idades entre 13 e 17 anos, sucumbem a tormentos psíquicos e se transformam em um capítulo trágico na história norte-americana após uma série de suicídios brutais. Tudo é narrado em retrospectiva por garotos da vizinhança que, apaixonados e curiosos pelo cotidiano da família Lisbon, reveem os episódios 20 anos depois, já adultos. Ambientado na década de 1970, em meio a revolução sexual e a decepção com os sonhos não realizados pela Geração Flower Power, o livro virou clássico cult e foi adaptado para o cinema por Sofia Coppola, em 1999. Com ele, Jeffrey Eugenides atingiu a elite da literatura contemporânea.

Nas primeiras páginas, a morte da caçula Cecilia, que sobrevive aos pulsos cortados durante um banho, mas é estraçalhada ao pular sobre uma cerca pontiaguda, três semanas depois, abre a vala de incertezas que domina o leitor até a página final. Com delicadeza e paciência, a trama salta feito areia retirada da cova com uma pá pequena e, aos poucos, forja cenários e acontecimentos dramáticos, sem apelar para ações extremadas. Sob a visão ingênua dos meninos, surgem angustias adolescentes – as irmãs Lisbon são criadas por pais religiosos e opressores quanto a interações com o sexo oposto. Sexo, aliás, que é dos grandes assuntos do livro.

Após a morte da mais nova, Therese, as irmãs Mary, Lux e Bonnie veem suas vidas com desprezo e, gradativamente, se enfurnam em seu casarão de madeira cada vez mais deteriorado. Em certas passagens, sentimos o cheiro da sujeira e da falta de manutenção acumulada por uma família destruída. O pai é demitido da escola que ensinava e as meninas param de estudar. Enquanto a mãe vira uma eremita em seu próprio quarto. Mas os meninos estão ali do outro lado da rua, concentrados em suas paixões juvenis – quando ver uma simples calcinha pendurada no varal fornece combustível imagético de sobra.

A temperatura sobe quando Lux entra em cena. Aos 16 anos, ela vira uma ninfomaníaca como solução para superar o trauma pós-suicídio de Cecilia. Furtivos encontros sexuais no telhado da casa deixam o leitor com um misto de excitação e repulsa – e aumenta a vigília dos meninos, ávidos por um flagrante. O breve romance com o galã do colégio, Trip Fontaine, surpreende a todos (o garoto se derrete pela rebelde, mas é dispensado sem explicação). O talento para detalhar sem entediar e a fluidez da escrita de Eugenides excluem qualquer vestígio de exploração fácil de temas comerciais.

Nos instantes finais, o narrador levanta a questão sobre motivos da carnificina coletiva. O que leva um adolescente a se matar? Problemas genéticos, algo hereditário, feito cardiopatias? Relacionamento conturbado com os pais, que despejam neuras nas crias sem dó e piedade? Inadequação social com colegas distantes e zombeteiros? Ou pura necessidade de aparecer, virar mito nacional? A psicologia e a psiquiatria são imprecisas quanto ao suicídio. Ainda mais se cometido por jovens. As Virgens Suicidas expõem o temor e o respeito que o ato representa. Para quem não leu, a nova edição (a terceira no Brasil) é indispensável na prateleira de quem está aberto para algo além do entretenimento assustador.


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