História da morte de cinco irmãs adolescentes
é contada por meninos da vizinhança,
em meio a descoberta do sexo e do amor
Por: Conrado Carlos
As Virgens
Suicidas seduz logo pelo enredo. Cinco irmãs, com idades entre 13 e 17 anos,
sucumbem a tormentos psíquicos e se transformam em um capítulo trágico na
história norte-americana após uma série de suicídios brutais. Tudo é narrado em
retrospectiva por garotos da vizinhança que, apaixonados e curiosos pelo
cotidiano da família Lisbon, reveem os episódios 20 anos depois, já adultos.
Ambientado na década de 1970, em meio a revolução sexual e a decepção com os
sonhos não realizados pela Geração Flower Power, o livro virou clássico cult e
foi adaptado para o cinema por Sofia Coppola, em 1999. Com ele, Jeffrey
Eugenides atingiu a elite da literatura contemporânea.
Nas
primeiras páginas, a morte da caçula Cecilia, que sobrevive aos pulsos cortados
durante um banho, mas é estraçalhada ao pular sobre uma cerca pontiaguda, três
semanas depois, abre a vala de incertezas que domina o leitor até a página
final. Com delicadeza e paciência, a trama salta feito areia retirada da cova
com uma pá pequena e, aos poucos, forja cenários e acontecimentos dramáticos,
sem apelar para ações extremadas. Sob a visão ingênua dos meninos, surgem
angustias adolescentes – as irmãs Lisbon são criadas por pais religiosos e
opressores quanto a interações com o sexo oposto. Sexo, aliás, que é dos
grandes assuntos do livro.
Após a morte
da mais nova, Therese, as irmãs Mary, Lux e Bonnie veem suas vidas com desprezo
e, gradativamente, se enfurnam em seu casarão de madeira cada vez mais
deteriorado. Em certas passagens, sentimos o cheiro da sujeira e da falta de
manutenção acumulada por uma família destruída. O pai é demitido da escola que
ensinava e as meninas param de estudar. Enquanto a mãe vira uma eremita em seu
próprio quarto. Mas os meninos estão ali do outro lado da rua, concentrados em
suas paixões juvenis – quando ver uma simples calcinha pendurada no varal
fornece combustível imagético de sobra.
A temperatura
sobe quando Lux entra em cena. Aos 16 anos, ela vira uma ninfomaníaca como
solução para superar o trauma pós-suicídio de Cecilia. Furtivos encontros
sexuais no telhado da casa deixam o leitor com um misto de excitação e repulsa
– e aumenta a vigília dos meninos, ávidos por um flagrante. O breve romance com
o galã do colégio, Trip Fontaine, surpreende a todos (o garoto se derrete pela
rebelde, mas é dispensado sem explicação). O talento para detalhar sem entediar
e a fluidez da escrita de Eugenides excluem qualquer vestígio de exploração
fácil de temas comerciais.
Nos
instantes finais, o narrador levanta a questão sobre motivos da carnificina
coletiva. O que leva um adolescente a se matar? Problemas genéticos, algo
hereditário, feito cardiopatias? Relacionamento conturbado com os pais, que
despejam neuras nas crias sem dó e piedade? Inadequação social com colegas
distantes e zombeteiros? Ou pura necessidade de aparecer, virar mito nacional?
A psicologia e a psiquiatria são imprecisas quanto ao suicídio. Ainda mais se
cometido por jovens. As Virgens Suicidas expõem o temor e o respeito que o ato
representa. Para quem não leu, a nova edição (a terceira no Brasil) é
indispensável na prateleira de quem está aberto para algo além do
entretenimento assustador.
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